quarta-feira, 18 de julho de 2012

R. Maharshi e o budismo (por A. Osborne)


"Conta-se que Bhagavan [Ramana Maharshi], perguntando lhe porque Budha recusava-se a responder perguntas relativas ã vida do além, “Talvez ele estivesse mais interessado no real trabalho de guiar os homens à Auto-realização, do que em satisfazer curiosidades inúteis”. 

Há grande semelhança entre os ensinamentos de Budha e de Bhagavan. 

Tal é demonstrado pelo fato de que a mesma essência espiritual anime a ambos os ensinamentos, não obstante o Budha haja criado uma religião que atendesse às necessidades de povos além [das] fronteiras indianas. 

Existem semelhanças entre todas as religiões, mas entre os ensinos desses dois mestres hás muito menor discrepância de que entre quaisquer outras. 

Não me referi a cosmologia budista que, de fato, está quase ausente das verdadeiras instruções de Budha, pertencendo mais a seus seguidores; falo do tema central do budismo. Assim como Bhagavan, Budha preferia não tocar nos assuntos teóricos de menor importância, a fim de não transviar o discípulo do esforço espiritual prático. 

Ensinava que o apego à ilusão ata o homem ao ciclo do nascimento, velhice e morte; e que a iluminação traz libertação. 

É claro que tal verdade básica encontra-se, duma forma ou de outra, nas várias religiões e instruções espirituais; mas ela e o tema central do Budha e de Bhagavan. 

Disso resulta que há, em ambos, injunção direta para repudiar a ilusão e buscar a iluminação, em lugar do processo indireto da recompensa pela virtude e do castigo pelo pecado. 

Emprego a palavra “indireta”, não só porque esta forma de ensinamento (disfarçado em apelo moral), pode ser apresentada com mais simplicidade como lei de causa e efeito, mas, também, porque leva o aspirante a visar estados intermediários entre este mundo e a realidade absoluta de Moksa ou Nirvana. 

Mesmo que tais estados sejam mais altos e reais do que a vida presente, continuam a ser ilusório à luz da verdade final da advaita. 

Mestres do gênero Budha e Ramana, recusando-se a reconhecer meta inferior ou qualquer realidade contingente, não de coisas “a vida do além”. 

Questionado: “Que serei quando morrer?” - Bhagavan retrucou: “Por que quereis saber o que sereis após a morte, se não sabeis o que sois em vida? Preocupai-vos, antes, em saber que sois agora”. 

Em outras palavras:- procurai a verdade final do ser, ele unicamente, está atrás de toda aparência desta ou de qualquer outra vida. 

Chegou afirmar explicitamente: “Ao homem sequer lhe apraz ouvir esta verdade, embora esteja pronto a conhecer o que há no além, e sobre o céu, inferno e reencarnação”. 

“Porque todos gostam do misterioso, mas não do verdadeiro, as religiões a todos atendem, a fim de que tal coisa os conduza de volta ao ser”. 

"Quaisquer sejam os meios adotados, devemos retornar ao ser; então, por que não nos fixarmos, desde já, no Ser?. 

A preocupação com os altos estados ainda contingentes, implica em ensinar no nível da realidade em que o ser é Deus, e o devoto acha-se separado de Deus; na verdade ultima, entretanto, não há dualidade. 

Eis porque, inquirido a respeito de Deus, ele respondia invariavelmente: “Porque quereis saber o que é Deus, antes de saber quem sois? Tratai primeiro de saber quem sois”. 

Vale dizer: porque parar ante, mesmo, à mais alta manifestação do Ser? Busque a última verdade do Ser que você é. 

Disse mais: “Não existe Ishwara”. 

E mais explicitamente: “Deus não existe separado do ser; e tal seria absurdo”. 

Verdade é que Bhagavan falava de Deus muitas vezes, posto que, enquanto continuar a concepção do ser individual, a concepção de Deus como Criador Amor e Juiz, terá que continuar também. 

Sempre disposto a conversar com todos no nível verbal que a pessoa entendesse, Bhagavan, entretanto, anunciava a verdade final a todos aqueles que abriram os corações plenamente aos seus ensinamentos; então ensinava: “Não há Deus nem você separados do Ser”. 

Nenhuma religião foi jamais tão desagradada como a daqueles budistas que, tentando acomodar-se ao modernismo, interpretam como ateísmo ou agnosticismo a recusa do Budha de fala de Deus. A baixo do nível de Deus e homem, encontra-se, apenas, a ilusão do ego; e acima dela está somente a Realidade do ser. Abaixo da aparência dos mundos superiores, está a este mundo físico; e acima disto está o ser em forma. Estes budistas “agnósticos”confundiram o inferior com o superior. 

A recusa de passar pelo nível do Deus pessoal (nível da verdade que, entretanto, não é a verdade final), é tomada por esses budistas (de que falamos), disfarçando sua inabilidade de elevar-se acima do mundo fenomenal, cuja condição ilusória o Budha explicou. 

Como Budha, Sri Bhagavan recusou-se igualmente a discorrer sobre o estado (se assim se pode chamar) do Jnani, isto é, o Nirvana , pois tal seria definir o indefinível. Inquirido a respeito da consciência física do Jnani , respondeu: “Pensais que o Jnani, tem um corpo ...”- e mais: Por que vos preocupais com o Jnani, antes de saberdes o que sois? Primeiro tratai de saber quem sois. E quando vos aperceberdes do que sois, é porque sereis um Jnani”. 

Explicações teóricas não auxiliam a ninguém e ainda podem ser impedimentos para o aspirante, fortalecendo-lhe a mente, em lugar de voltá-la para o interior, na busca do ser em que ela deve se submergir. A especulação mental não é a menor das defesas do ego contra o esforço espiritual. E se o esforço se dirige para aquilo que está além da mente, seria contradição buscar elucidá-lo com a mente. 

Seria como querer encerrar o oceano num balde. Bhagavan afirma: “o Ser é auto-efulgente. Não podemos dar-lhe um retrato mental. O pensamento que imagina é, em si mesmo, um grilhão. Sendo que o Ser é a auto-efulgência que transcende a luz e a escuridão, não podemos pensar nele com a mente. Tal imaginação nos levará à escravidão, enquanto que o Ser cintila espontaneamente como o Absoluto”. 

Verbalmente, existe contradição entre o que ensina Bhagavan e as pregações do Senhor Budha, desde que Bhagavan declara que só existe o Atma, e o Budha declara que o Atma não existe. Mas é apenas contradição verbal, pois Sri Bhagavan usava a palavra Atma para significar o Ser universal, que é Nirvana, enquanto o Senhor Budha se referia à alma individual. 

Além disso, Sri Bhagavan ensinou, também, que não existe um ser individual, não apenas no sentido que não perdurará depois da morte, mas que também não existe agora. “Não vos preocupeis com o que sereis após a morte; tratai de saber o que sois agora”. 


Instrutores têm conduzido seus seguidores por mais gradual caminho, guardando seus olhos ofuscante simplicidade da verdade final, afirmando a sobrevivência da alma após esta vida. Entretanto, a contradição como todas as contradições espirituais, é somente aparente e a clara percepção disto está na verificação de que o budismo, como doutrina, combina noções de céu, inferno e reencarnação com a noção da irrealidade da alma individual. 

Qualquer outra vida ou mundo é tão real quanto este, mas a verdade é que tudo isto é irreal. Por conseguinte, em lugar de conduzir o homem na busca dum nível de relatividade superior, Bhagavan e o budha insistem em que o ego é totalmente irreal – seja nesta vida ou em qualquer outra. “Primeiro buscai o que sois agora”. 


O Budha nenhuma importância dava às teorias. Seu propósito era menos construir uma cosmologia do que mostrar ao homem o caminho que vai do sofrimento à Paz. Como Sri Bhagavan, ele punha de lado as soluções parciais concernentes ao caminho, e timbrava na pura afirmação do Nirvana e de Maia do ser e da ilusão. Mesmo assim, os teóricos apossaram-se de seus ensinamentos, criando padrões que em nada contribuíram para que eles mesmos, ou outros possam escapar do sofrimento. É possível que eles queiram aferrar-se aos ensinamentos de Sri Bhagavan, mas seu real ensinamento jamais poderá a ser encerrado em suas exposições, pois seu ensinamento é abandonar o não-essencial e seguir o caminho da auto-realização. 

Ao lhe apresentarem questões nascidas do esquema das especulações espirituais da Índia, ás vezes, Sri Bhagavan respondia de uma forma técnica. Mas, geralmente, ele se esquivava à resposta direta. Nenhum apoio dava à especulação mental e desencorajava sempre as ciências espirituais relativa à vasta região da realidade intermediária: “Assim como é fútil examinar o lixo que já foi varrido e jogado fora, também o é que aquele, que busca o conhecimento do ser, detenha-se a enumerar e examinar as qualidades dos Tattwas (envoltórios do ser), em lugar de lançá-los fora”. 

Não somente estava o Budha desinteressado de elaborar uma cosmologia, como também não fez o menor esforço para estabelecer uma ordem social. Se algo fez nesse sentido, foi somente pela negativa de reconhecer qualquer casta social. 

Todo aquele que provava ser capaz de seguir a Senda, era considerado capacitado. 

Bhagavan teve essa mesma atitude mas, como seu propósito não era formar uma nova religião – ou nova ordem social, - jamais disse coisa alguma contra ou a favor das castas. 

Mui simplesmente a todos concedia sua Graça na medida em que estavam prontos para recebê-la. Se os Brahmas [brâmanes] queriam ficar separados dos demais, no “hall” do Ashram, tal podiam fazer, - mas o Mestre não se unia, então, aos Brahmas. Bhagavan aprovava os recitáveis védicos no hall, pela manhã e à noite, mas nenhum devoto – fosse mulher, fosse de casta inferior, ou forasteiro, - podia ser excluído de sua presença durante a cerimônia. 

A diferença de expressão entre os ensinos de Budha e de Sri Bhagavan é conseqüência de que o primeiro estava formando uma nova religião. Logo, ele falava de modo que atingisse às massas, bem como aos buscadores, em geral. Por isso, embora ressaltando que é o conhecimento que leva à libertação, derramava seus ensinamentos num molde de maior teor emocional, acentuando a questão do sofrimento e do alivio ao sofrimento. 

Mas o significado é o mesmo: é o apego que traz sofrimento; e apego e uma ilusão que somente pode ser dissipada pelo conhecimento. De outro lado, exatamente porque os ensinamentos foram adaptados ao mundo em geral, os genuínos buscadores do caminho, que desejavam sua essência, teriam que renunciar ao mundo. 

Renunciando ao lar, a todas as propriedades, e entrando num mosteiro, estavam criando um símbolo externo de renúncia ao apego, repudiando a ilusão para poderem penetrar no coração. 

O Mestre espiritual sempre é portador da mensagem adequada ao momento. No tempo do Budha, um novo veículo religioso era necessário aos povos do leste asiático. 

No tempo de Sri Bhagavan, foi necessário um novo caminho espiritual que pudesse ser trilhado nas condições do mundo moderno, pelos devotos de todas as religiões – que buscam e não encontram orientação espiritual. 

Desde que os ensinamentos de Sri Bhagavan são dirigidos aos aspirantes ao Caminho, ele fala com clareza e tranqüilidade – acentuando mais o tema da ignorância, do que o do sofrimento; mais o Conhecimento, do que o alívio do sofrimento. 

Não formulando uma nova religião para o mundo, ele não desvia seus devotos da vida do mundo. 

As condições da vida moderna são tais, que é impossível àqueles que anseiam por graça e orientação afastar-se do mundo, ou mesmo observar as completas e detalhadas obrigações de suas religiões, quaisquer sejam elas. 

Bhagavan absolve dessa necessidade a todos para ele se voltam. Este é seu grande donativo de compaixão. Não somente hindus, mas budistas, cristãos, muçulmanos, judeus, parsis, dirigiam-se a ele, e jamais qualquer um recebeu conselho de trocar duma religião para outra. 

Ele prescreveu o vichara para todos, igualmente. Bhagavan, desde que quaisquer outras observâncias de qualquer religião ajudavam o devoto dela, jamais aconselhou que fossem abandonadas tais observâncias..."

domingo, 15 de julho de 2012

O Coração Espiritual




"Este Brahman é puro brilho, residindo na cavidade do coração. Ele é o grande suporte de todas as coisas. Nele estão centradas todas as coisas moventes. O discípulo que O conhece em seu Ser percebe que Ele é o grosseiro e o sutil, é o adorável, o supremo, situado além do entendimento das criaturas.”

"Brahman brilha vasto, auto-luminoso, inconcebível, sutil dentro dos sutis. Ele está além do que está além, mas, está aqui, ao alcance da mão. Na verdade, Ele pode ser visto aqui, morando na cavidade do coração dos seres conscientes.”

"Àquele que conhece tudo e percebe todas as coisas, pertence toda a glória do mundo; Ele, o Atman, está localizado na fulgente morada de Brahman [o coração]. Ele assume a forma da mente e conduz o corpo sutil, após a morte, ao corpo denso. Ele reside no corpo físico dentro do coração. Conhecendo Aquele que brilha e que é o imortal Atman, o sábio a Ele pertence, Ele que está em todas as coisas.”

(Mundaka Upanishad)





"...que o coração físico esteja do lado esquerdo, é indiscutível. Porém, o coração de que falo fica do lado direito. É a minha experiência. O cosmos inteiros está ligado a um pontinho no coração. O coração não é um lugar. Olhe para dentro. O coração não é físico. É o ponto central de onde surgem todas as coisas.No coração podemos encontrar nosso laço indestrutível com o universo cósmico. E, uma vez que sentimos nele esse universo como presença viva, nossa consciência se eleva muito acima do egoísmo. Advém-nos uma satisfação interna que é completa em si mesma e que nada tem a ver com as circunstâncias externas da vida.Quanto mais interiorizamos a atenção, mais nos deixamos atrair e guiar por essa imensa e misteriosa presença espiritual que reside no coração."




"De modo semelhante, Deus, dizem, mora no Coração. O Coração não é um lugar. Algum nome deve ser dado à moradia de Deus em razão de pensarmos que somos o corpo. Esse gênero de ensino tem significado somente para quem aprecia o conhecimento relativo. Deus, sendo Imanente em toda parte, não tem lugar específico para Sua morada. Por pensarmos estar no corpo, também acreditamos que nascemos. Entretanto, não pensamos no corpo, em Deus ou em nosso método de realização quando estamos dormindo profundamente. E mais, quando estamos acordados, tomamos posse do corpo e pensamos que nele estamos. Paramatma é isso de que o corpo nasce, em que ele vive e dentro do qual ele se dissolve. Nós, todavia, pensamos que residimos no corpo. Assim sendo, haverá quem ensine tais coisas daí por diante? O significado do ensino é o seguinte: "Olhe para dentro". O "Coração" não é fictício. A meditação não deve ser mantida nem à direita nem a esquerda e sim, unicamente no SER. Cada um sabe "eu sou". Que é esse "eu"? Tampouco seria fora ou dentro, nem à direita nem à esquerda. Esse "eu sou" é tudo. O Coração é o ponto central do qual surgem todas as coisas. Por isso é que você vê o mundo, o corpo, etc., dizem haver aí um centro a que chama Coração. Mas, quando realmente queremos Nele estar, percebemos que o Coração não é nem o centro, nem a circunferência, mais nada havendo então."

(Ramana Maharshi)


"[o coração é]o lugar onde se alçam os raios da lua e a abertura das portas (da Realidade) para o místico.”

(J. Rûmî, Fonte: Masnavi, II, 165)




“Eu estou cego e não vejo as coisas destes mundo; mas quando a Luz desce do Alto e ilumina o meu coração, então vejo, porque o Olho do coração tudo vê. O coração é um santuário no centro do qual existe um pequeno espaço onde o Grande Espírito vive, e este espaço é o Olho. É o Olho do Grande Espírito, com o qual Ele vê todas as coisas e através do qual nós O podemos ver. Se o coração não é puro, o Grande Espírito não pode ser visto, e a alma daquele que morre nesta ignorância não pode regressar imediatamente para o Grande Espírito, ela terá de ser purificada através da vivência na terra. Para conheceres o centro do coração onde reside o Grande Espírito terás de ser bom e puro e viver da forma que o Grande Espírito nos ensinou. O homem que for assim puro contém o Universo no espaço do seu coração.”
(Alce Negro, chefe sioux)